O internauta colabora

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domingo, 10 de dezembro de 2023

Inesquecível Sorriso

 

               

 

            Há mais de cinquenta anos um rapazote, cruzando as fronteiras entre a adolescência e a juventude andava pelo interior do Rio Grande do Sul, vendendo livros para poder continuaar os estudos e, quem sabe, libertar-se da pobreza financeira da família.

            Tratava-se de rapaz com dificuldades de iniciar novas amizades e contatos. Nesta fase inicial de abordagem era com muito esforço que conseguia falar com estranhos e, pior, vender-lhes alguma coisa.

            Mas a necessidade obriga o ser humano a matar um leão por dia. E, de fato, sair do lugar onde estava rodeados de amigos, familiares e, com dinheiro apenas para a passagem de ida , um mostruário de livros e várias revistas para vender, exigia uma coragem e uma disciplina que o tal adolescente não sabe onde conseguia.

            E lá se foi, num mês de julho, com frio e tudo, para Sobradinho, pequena cidade de italianos e alemães, mais italianos, penso, agricultores familiares na maioria. Tudo apontava para uma guerra inglória e a incerteza quanto à vitória apavorava o rapaz.

            Nesta tremenda pressão psicológica, na solidão, num quartinho que parecia uma cela de cadeia, o ânimo e o otimismo estavam no  décimo-quinto subsolo ...

            O levantar-se, olhar para o tempo, torcendo para que estivesse chovendo e assim ter desculpa para ficar no quarto, lugar deprimente, mas menos ameaçador do que abordar estranhos exigia um esforço sobre-humano.

            Cada pessoa que passasse na rua era um inimigo possível a ser vencido. O dono de um armazém, loja, bar, escritório, consultório era aquele que poderia destruir o pouco de ânimo que porventura restasse. Tocar uma campanhia era cutucar um vespeiro de onde poderiam vir terríveis abelhas africanas e, raramente, alguma abelha sem ferrão. A possibilidade de ser maltratado era real, embora na maioria das vezes as pessoas o recebessem educadamente e com cortesia.

            Se na primeira visita saísse alguma venda, o Sol aparecia no horizonte, sorridente, iluminando e aquecendo a alma do sofrente vendedor. Caso, ao contrário, as primeiras abordagens fossem infrutíferas, a vontade era de sair caminhando, caminhando, para só parar quando não mais restassem forças.

            Qualquer trabalhador, por mais humilde que fosse, era invejado: "esse não precisa vender livros". E queria  ser gari, motorista de taxi, cobrador de ônibus, garçon, qualquer coisa que não fosse vender livros. Eram pessoas que tinham seu salário (e podia ser miserável), tinham sua casa (e podia ser um barraco), uma família que o aguardava, não um frio e úmido quartinho de pensão para ser compartilhado apenas com seus medos e certeza de que tudo ia dar errado.

                        Pois nesse estado de espírito saiu o homenzinho para mais um dia de vendas: o tempo conspirara e não chovera, sequer estava nublado e o frio não era severo. Era julho, mas soprava um vento norte, vento quente. De fato, não havia justificativa para ficar parado.

            E assim se foi o guerreiro, querendo ser atingido em batalha para voltar à segurança incerta do quartinho. Só que tudo conspirava contra e a opção era vender ou vender.

            Eis que aí, ao dobrar uma esquina, vinha em sentido contrário uma turma de adolescentes, felizes todas, com o rosto irradiando otimismo e fé no futuro.

            O importante, porém, não era a turma toda, mas uma das meninas, a mais sorridente e simpática: caminhava de muletas e, pelas suas pernas, dava para ver-se que fora uma das vítimas da paralisia infantil (poliomielite), cujas vacinas preventivas ainda não haviam atingido toda a população.

            Tem coisas que a gente nunca mais esquece: o sorriso daquela menina quase levou o desanimado às lagrimas, se é que não  levou, como agora acontece, somente com a lembrança daquele sorriso.

            Se ela, menina linda, castigada pela estatística sanitária, conseguia, mesmo sabendo que nenhuma culpa tinha pela tragédia de sua vida, irradiar um sorriso tão contagiante, tão poderoso, capaz de reanimar um vendedor desistente, por que ele, saudável, caminhando naturalmente e com energia haveria de entregar a rapadura?

            Talvez tenha sido aquele sorriso que fez o rapaz tomar tenência, firmar propósito, a ponto de vender tão bem, que em apenas duas semanas de trabalho vendeu mais do que a maioria dos colegas em todo o mês.

            Não sei onde foi a italianinha linda que fez renascer num adolescente a fé em sua potencialidade. Não sei se os descaminhos da vida não a tornaram uma velha amargurada e ranzinza. Não sei se ainda está viva, se ainda possui aqueles dentes lindos, se aqueles olhos ainda sorriem.

            Sei apenas que existem pessoas que chegam ao mundo com a missão de torná-lo melhor, de minimizar os sofreres, de trazer luz aos caminhos sombrios.

            Gringa de Sobradinho: que o Universo conspire para que ainda tenhas o poder de pelo menos sorrires para o espelho e enviar ao fundo de tua alma a mesma fé e alegria que deste a um introspectivo adolescente que conseguiu vencer seus invisíveis monstros interiores.

            Continua como eras: se não conseguires reavivar outros vendedores, reanima a ti mesma para que o final de teu caminho  seja primaveril, florido, ameno, com um lindo Sol te mandando um sorriso  e o mesmo vento Norte morninho beije tuas faces já enrugadas de tanto sorrir para a vida.

            16 de outubro 2022-10-16

sábado, 23 de setembro de 2023

De Pé Fincado

 

De orgulho sempre tapado,
Na Semana Farroupilha,
O peão o pingo encilha.
Desfila, peito entonado,
Pois sabe que seu Estado
Nasceu a ponta e lança
E de pelear não se cansa;
Mesmo a morrer não se nega
E se mui feia a refrega
Nunca perde a esperança.
O caldo entornou de fato
Neste malvado setembro.
De enchente igual, não lembro.
Oigalete tempo ingrato:
Foi cidade, campo e mato,
Tudo a água arrastando,
Mas o gaúcho peleando,
Não se entrega, tem garrão.
E pra aguentar o tirão
Até o Sol tá mateando.
Pode ser uma imagem de 1 pessoa, grama, horizonte, crepúsculo, moinho de vento e corpo d'água
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quinta-feira, 14 de setembro de 2023

São Vicente do Sul - Rios Continuam Subindo



    Como é normal no regime do rio Toropi, as águas subiram. Devem subir ainda por mais 24 horas, no mínimo. 

    Neste momento, 10 h e 16 min, céu parcialmente nublado, vento fraco. 11 graus. 

   Os indicativos "científicos" e os empíricos são de que haja uma folga em termos de chuva. 

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quarta-feira, 13 de setembro de 2023

O Tempo se Armou de Fato ...

   Foram 110 mm em apenas 24 h (de ontem p hoje, 13 de setembro).

   

    A enchente que virá, deve ser grande desta vez. Na maioria dos casos o rio Toropi continua subindo por 48 h após o cessar da chuva. 

Assim que pare de chover, faremos imagens com o drone.

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Granizo em S. Vicente do Sul 

Foto feita por Fabiane Bruck (na casa da família, em princípio, não se verificou dano).
Nesta madrugada  na cidade de São Vicente do Sul.

Sabe-se que houve várias casas com danos no telhado. 

   Prefeitura está distribuindo lonas. Entre na página da Prefeitura no Facebook

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ALERTA DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO VICENTE DO SUL

ATENÇÃO AOS ACESSOS
Devido as fortes chuvas e ventos durante a noite, tivemos várias quedas de árvores e barreiras na BR 287, em especial entre Santiago e Jaguari, a PRF com apoio de usuários e populares conseguiu ao longo da madrugada liberar o trânsito ao menos em meia pista nos lugares mais críticos.
Permanece com restrição de tráfego com sinalização nos seguintes pontos:
- KM 372, próximo a entrada de Nova Esperança do Sul, onde houve queda de árvore de grande porte e barreira em parte da pista;
- KM 356, próximo ao trevo de Jaguari, onde caiu árvore e pedras sobre parte da pista de rolamento;
- KM 346, próximo a Granja Jaguari, informação recente de árvore grande caída, Equipe PRF em deslocamento;
Equipes da Empresa LCM de manutenção da rodovia já acionados e em deslocamento, Defesa Civil de Santiago também no local e acionando máquinas da Prefeitura Municipal de Santiago para apoio.
Solicitamos atenção dos motoristas em todo o trecho devido galhos de pequeno porte ao longo da rodovia, assim como acumulo de água na pista em muitos pontos, o torna maior os riscos de aquaplanagens.


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Para Descontrair um Pouco

(Pajadinha curta)




terça-feira, 12 de setembro de 2023

Previsões Meteorológicas Erram e Chuva Foi Bem Maior do que Prognósticos

 



   Não há como voar com esse tempo para fazer fotos comparativas com o nível de ontem às 18 h. Mesmo que o rio ceda um pouco, com toda essa água, teremos uma grande cheia. Não ouvi falar de alertas ou medidas para a região dos vales dos rios Toropi, Jaguari, Santa Maria e Ibicuí, aqui na Região Central. 

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Pajada sobre a Ação do Homem contra o Rio

Título: O Choro do Rio




segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Nesta tarde rio Toropi atingiu o nível mais alto

 



   Estivemos no local e deu para ver uma pequena baixa. Se a chuva prevista para iniciar esta noite não for muito intensa, são boas as possibilidades de não haver aumento significativo de área inundada. 

domingo, 10 de setembro de 2023

Monitorando a Cheia do Terceiro Ciclone

        CONFIRMADA A ELEVAÇÃO DAS ÁGUAS 




    Fotos de domingo, 10, 13h e 15 min.



   Como se vê o Tororoipi continua também muito cheio. Em tempos normais parece uma sanguinha de nada. 

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sábado, 9 de setembro de 2023

Foto Panorâmica Aérea da Enchente do Toropi - 09/09/23 - 15 h



A foto acima é do Toropi. Como se vê houve uma pequena baixa no nível das águas.

 

                O surpreendente é a grande cheia do Tororoipi ou Tararaipi. 

            Existe a possibilidade de chegar a água vinda das cabeceiras e aumentar a inundação da várzea durante esta noite e amanhã. Depende do quanto choveu lá nos altos e se houve boa distribuição da chuva no decorrer do tempo. Pancadas torrenciais sempre causam mais inundação. 

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Fotos para Acalmar



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 E a chuva continua: 40 mm desde a tarde de ontem, sexta-feira, 08 de setembro. Confirmando nossas previsões de costeiro, o rio Toropi baixou um pouco, mas, é quase certo que a partir desta tarde as águas voltem a subir. Postagem feita às 09h e 20 min.

Dia amanheceu "garoento", mas há previsões de que o Sol apareça esporadicamente à tarde. Ao fundo vê-se que a várzea do Toropi ainda tem bastante água.

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Se o tempo permitir, à tarde faremos novo voo com o drone sobre a área atingida.

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

A Chuva não Deu Trégua

 A previsão confirmou-se e chegamos aos 55 mm na Palma. Na várzea do Toropi, numa avaliação visual terrestre, parece haver diminuído a área inundada. Deve ceder mais um pouco ainda, mas, como a região está encharcada e se choveu na mesma intensidade nas cabeceiras (Jari, Quevedos, cidade de Toropi) há possibilidades de termos uma nova subida das águas maior do que a verificada até quinta pela manhã. 

Continuaremos monitorando. Assim que diminuir a umidade, faremos novo voo de drone.

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quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Evolução da Enchente do Rio Toropi - Terceiro Ciclone

 


  Em relação à foto de ontem, dia 06, 14 h, nota-se que houve pequeno aumento na área inundada à esquerda da BR 287  e maior aumento de áreas ocupadas pela água do lado de baixo do curso do Toropi. Talvez tenha havido represamento de águas no sistema dos rios Ibicuí-Jaguari-Santa Maria. Pela experiência do blogueiro como criado na costa do Toropi, as águas devem começar a baixar ainda hoje. Se as chuvas forem de média intensidade, para esta nova previsão, é quase certo que não teremos grande aumento no nível da cheia. 

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quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Terceiro Ciclone Extratropical Causa Enchente do Rio que já Iguala-se à do Ciclone Anterior


    Resta torcer para que as chuvas previstas para os próximos dias não sejam tão volumosas e venham escalonadas, não repentinamente, como aconteceu agora. 

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segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Senhores da Guerra

 Senhores da Guerra

Os senhores da guerra decidiram que também são os senhores da vida e os arautos da morte!
Os senhores da guerra decidiram que a paz é um alvo a ser abatido!
Os senhores da guerra decidiram que o sorriso meigo da menina-mulher deve ser apagado da memória de todos os jovens na plenitude de seu vigor físico, pois eles valem mais como anjos do ódio do que do amor!
Os senhores da guerra decidiram que conquistar a terra onde gerações e mais gerações cultivaram o trigo para alimentar seus filhos é uma estratégia de manutenção de poder, não um crime!
Os senhores da guerra, que se conhecem, se odeiam, já desperdiçaram suas vidas carcomidos pelo vírus da ganância, decidiram enviar para a morte certa os que recém despertam para a vida e para o amor!
Os senhores da guerra não querem mais crianças correndo nos parques, nos campos, subindo em árvores, cantando e gritando apenas pela alegria de estarem vivas!
Os senhores da guerra não querem que a humanidade veja o amanhecer de um novo dia sem o troar dos canhões!
Os senhores da guerra não querem ouvir a sinfonia dos pássaros cantando depois da chuva!
Os senhores da guerra querem ouvir o assobio mortífero dos mísseis que vão despedaçar corpos, vidas, planos e esperanças!
Os senhores da guerra não querem nos céus o passeio das nuvens, "esses cágados lentos" de Mário Quintana!
Os senhores da guerra não querem o choro dos recém-nascidos alegrando os corações dos pais!
Os senhores da guerra não querem que amigos atravessem as fronteiras e se abracem!
Os senhores da guerra não querem que a humanidade se ame, se ajude, se proteja!
Os senhores da guerra querem mais território, mais riqueza, mais produção, mais "podres poderes"!
O senhores da guerra, ah, os senhores da guerra: por que não morrem todos?
E no enterro coletivo dos senhores da guerra a humanidade cantaria, tocaria todo o tipo de instrumentos, dançaria e viveria um novo tempo, onde os senhores da guerra já nasceriam
todos devida e necessariamente mortos!
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domingo, 13 de agosto de 2023

Mais uma do Manicaca (Piloto "Barbeiro)

                Uma Viúva-Negra como Saco

 

            Pois o escrevinhador manicaca confessa que tem medo de cobra.

            Porementes, isso é só o começo: por um motivo ainda não esclarecido e por mais estranho que pareça, de aranha tenho verdadeiro pavor.

            Quando piá de campanha, várias vezes, do alto de meus nove, dez anos de idade, matei várias cobras cruzeiras de médio porte (dois a quatro palmos de comprimento) com modesta varinha de alecrim, arrancada do chão com a batata da raiz, que era usada como a arma fatal das tais cruzeiras.

            O pior desta história é que quando a gente contava para os adultos o que tinha feito, estes faziam de conta que repreendiam, mas num tom que era quase um elogio à coragem e eficiência do piazedo como exterminadores de animais peçonhentos.

            Mas sempre, ao ver uma aranha de porte médio para cima o pavor quase me paralisa.

            Em anteriores postagens já falei da minha precaução com os tequinhos aqui no hangar: como sempre me falassem que Creolina espanta cobras e aranhas, andava gastando quase que mais com o dito repelente do que com a gasolina dos voos. Coincidência ou não, dentro do perímetro isolado com o borrifamento de água e creolina, nunca encontrei cobra ou aranha.

            Mesmo com esses cuidados ainda me borrava de medo de, em pleno voo, descobrir a condução de uma passageira não convidada ...

            No preparo do avião, além do check-list convencional, acrescentava sempre o item: - célula livre de animais venenosos, inclusive aranhas.

            Sempre mantive o costume de, ainda que não fosse exigência regulamentar, usar capacete, pelo menos nas decolagens e pousos. Isso porque conheci muito caso de piloto que quebrou o focinho ou o material pensante ao bater o coco no painel ou outra parte do avião.

            Como “respeitador” de cobras e aranhas sempre checava a parte interna do chapéu protetor, abrindo o forro, para ver se não tinha algum ser comprido ou multipernado querendo voar de saco.

            Num belo domingo tive que fazer um voo meio comprido no famoso 15 Bis, uma cruza de Netuno com Kitfox, construída pelo Carlos Ramão Ledur, e motorizado com um prosaico motor Volks 1600, carburação simples. A não ser a potência meio bastante fracota, no demais o tequinho era muito bom. Excelente de comandos, estável para o peso e categoria.

            Saí aqui da pistinha da Palma, me larguei no rumo de Santiago e Bossoroca. Fui tirando uns retratos, como diz o Jader Dutra (Jajá) e já cheguei em Bossoroca com uma duas horas de voo.

            Hora de completar os tanques e pôr alguma coisa no bucho.

            Deu acaso que pousei na pista do saudoso Telmo Dutra bem no momento em que ele estava indo para casa, pois era hora de almoço.

            Rapaziada: nem lhes conto. Tive tanta sorte, que cheguei bem num dia em que se festejava o aniversário, ou do Telmo ou do filho dele.

            Era um domingo de muita sorte, aquele.

            Por uma questão de etiqueta tive que fazer hora depois do almoço, mas, lá pelas tantas, não dava mais para adiar a decolagem.

            - Telmo, me desculpa, a comida estava excelente, o papo melhor ainda, mas tenho um Rodeio para fotografar em Bossoroca e a hora de maior movimento lá está chegando. Pede para alguém me levar à pista.

            Pois homem parou tudo, pediu licença aos convidados e me largou junto ao tequinho.

            Gente hospitaleira era o Telmo. Lamentavelmente meses depois o enorme coração hospitaleiro inventou de falhar e o Telmo foi fazer voos mais altos do que os que sua aeroagrícola fazia na região.

            Como cheguei à pista em cima do laço, fiz um cheque apressado, apertei os cintos, coloquei o capacete e nos largamos, o 15 Bis e eu – só o risco e o fedor nos céus da Bossoroca, terra do Noel Guarani.

            Voava eu, feliz que nem mosca em tampa de xarope, grato pela churrascada, a manifestação de amizade do Telmo e o dia calmo e limpo para um final de voo tranquilo e gratificante.

            Ia tudo assim, senão quando sinto uma coceirinha entre o capacete e o coco.

            “Será que o anticaspa não está fazendo efeito?” pensei.

            Mas aí a coceira tomou o formato de perninhas se movimentando.

            Estava completa a desgraça: ou esse bicho me pica e o veneno me tonteia, fazendo perder os sentidos ou parte deles e não consigo mais pilotar ou mantenho a calma, mesmo cagado, tento tirar o capacete com caranguejeira, viúva negra ou sei lá que aranha gigante sem que ela injete o terrível veneno.

            Abri a janela para, caso conseguisse tirar o capacete sem ser envenenado, jogá-lo fora com aranha e tudo.

            Desafivelei, dei um jeito de ficar com o manche no meio das pernas e pilotar sem as mãos, o que, felizmente já tinha prática em fazer.

            Em cada lado do capacete uma das mãos, para ser rápido no arremesso do monstro que planejava me fazer de seu almoço.

            - Um, dois, três: saquei o capacete e já ia arremessando janela a fora quando a terrível viúva-negra se transformou numa rã que pulou para o parabrisa, onde ficou me olhando com uma cara mais assustada do que a minha.

            Acho que deve ter pensado: “Eu é que não fico neste avião cheirando  merda por duas horas”.

            E pulou pela janela.

            Nunca mais deixei o capacete no hangar e, mesmo assim, acho que levava mais tempo examinando a forração dele do que em todo o resto da rotina de preparo para um voo.



            13 de agosto de 2023.